Se George Orwell fosse um
blogger, mudaria o título do seu famosíssimo livro para "
O triunfo dos Gatos". Perito como era em analogias com o reino animal, teria provavelmente sucumbido à avassaladora invasão da blogosfera pelos gatos.
Esta constatação reflecte um fenómeno que alguém, algum dia, se dará ao trabalho de estudar. Tenho-me dado conta de que há uma imensidão de
blogs que glorificam os pequenos felinos, e o mais engraçado é que são, muitos deles, os
blogs e os
bloggers com quem eu descubro mais afinidades. Se quisesse dar-me ao trabalho de extrair da minha lista os
links para os amantes de gatos, tenho a certeza de que a percentagem me deixaria de boca aberta. Para citar só alguns exemplos de entre os que visito regularmente,
este,
este,
este,
este,
este e
este. E isto tem que querer dizer alguma coisa.
Ora, eu fui educada a não gostar de gatos. Em casa dos meus pais a primazia sempre foi para os cães e, durante muitos anos, esses cães eram galgos. O meu pai era um exímio cavaleiro e um apaixonado por caçadas às lebres, prazer que só abandonou depois de uma fractura grave numa perna, devida à queda de um cavalo. Mas os galgos ficaram por lá, correndo no pátio de casa atrás dos (muitos) gatos da vizinhança. Lembro-me bem do Aquiles, do Falcão, da Torrinha, do Tango, do Raiado, da extrema elegância dos corpos longilíneos e musculados num quase voo rasante, perseguindo, a uma velocidade alucinante, os pobres gatos que se atreviam a entrar por entre as grades do portão e só paravam, salvos de morte certa, no galho mais alto de uma das árvores. Depois dos galgos vieram os labradores, os pastores alemães, os
grand danois.
Eu adorava animais: tive em casa toda a espécie de bicharada, desde o impossíveil Pirueta, um coelho que se escondia na prateleira mais alta da estante e que corria loucamente pela casa toda (milagrosamente, nunca foi comido por nenhum dos cães), ao incómodo Xico, um cabrito bebé que trepava a sofás e mesas e que os meus pais condenaram rapidamente ao prato, sem eu saber. Pelo meio, rãs, lagartixas, mochos e até ratos, todos criei com desvelo, em caixas de sapatos ou gaiolas, até se transformarem em insuportáveis adultos que todos odiavam, menos eu. Mas esse afã de maternidade precoce nunca incluiu gatos.
Não nego que acho os gatos, como todos os felinos, animais lindos. Que admiro neles a natureza livre e indomável, a orgulhosa recusa em bajular os donos, a independência emocional. E até penso que, por definição, os gatos teriam mais a ver comigo do que os cães. Mas a verdade é que isso não acontece, e a explicação para esse mistério só poderá estar numa infância despovoada de gatos (ou povoada de gatos que não eram mais do que negaças para treino dos galgos), em que os cães eram os reis absolutos da casa.
(Fotografia encontrada aqui)