Terça-feira, 3 de Fevereiro de 2009

Pocket Classic (Ulisses)

Marie Tourvel

 

 

Descobri através de exaustivas pesquisas que milionários não têm tempo para ler crássicos da literatura, mas os mesmos não querem ficar de fora dos papos de intelequituais. É pura bobagem da parte deles. O talento deles já é pra ganhar dinheiro, não precisa dizer que leu os crássicos, não. Mas eles querem ser citados como milionários cultos, então dou minha contribuição. Eu tive tempo de ler tudo quanto é crássico. Infelizmente, não tenho o talento para virar milionária e muito menos sou uma intelequitual. Só li muito e tenho facilidade pra decorar. E estou desempregada, ociosa, esperando o maldito mercado decidir se vai ou se vem.

 

Entendam uma coisa: ler não torna ninguém melhor ou pior. A literatura não forma caráter. Caso contrário, Hitler seria a melhor das pessoas por ter lido Flaubert, não é mesmo? Ler é um dos prazeres da vida, não é nem o primeiro, pois sou perfeitamente consciente de que há prazeres muito maiores que este. Mas nosso amigo bilionário não tem tempo para esse tipo de prazer, porque em seu tempo de férias ele prefere esquiar em Aspen a ler crássicos da literatura.

 

Então, toda semana eu presentearei os millionnaires com um resumo de um livro famoso. Não, milionário querido, não falarei de Paulo Coelho. E, pelamordedeus, nunca o cite nessas rodinhas, hein? Mesmo que você adorou ter lido O Alquimista, só o cite para ridicularizá-lo. Geralmente os intelequituais pobretões adoram ridicularizar escritores que ficaram milionários escrevendo porcarias.


Já pensou se numa rodinha com aqueles jornalistas intelequituais, porém, pobretões, você fizer um comentário bacaninha sobre Dostoiévski, por exemplo? Eles ficarão impressionados e pensarão: "Puxa, como esse cara é phoda, além de ganhar dinheiro paca, ainda leu tudo o que eu li. Sou um bosta, mesmo". Faça um intelequitual verdadeiro se sentir um bosta. É divertido. Isso não tem preço.


Comecemos, então, com o resumo de um livro daqueles difíceis de digerir. Ulisses de James Joyce. Ele é citado em onze entre dez rodinhas sabichonas. O resumo é isso aí:


Leopold Bloom sai de casa para um enterro e irá percorrer Dublin (é Irlanda, tá? Não a do norte, please... isso mesmo, terra do Bono Vox) durante um dia inteiro, visitando biblioteca, jornal, bordel e bares. No final ocorre o encontro com Stephen Dedalus, um jovem intelectual de Dublin. O Sr. Bloom é o equivalente ao Ulisses (ou Odisseu), herói da "Odisséia" e Stephen, a Telêmaco, seu filho. Assim como na obra de Homero, o herói faz um grande caminho e retorna pra casa, reencontrando o filho, representado por Stephen.


Não esqueça de citar o Bloomsday que é comemorado todo dia 16 de junho (a história se passa nesse dia, entendeu?). Diga que geralmente neste dia vai a um pub em algum lugar do planeta e toma uma Guinness em homenagem a Joyce. Isso impressionará os mais ralés.


Não importa que você não tenha entendido picas. Se começarem a perguntar algo de muito profundo do livro de Joyce, como por exemplo sobre a linguagem inovadora, você diz: "Sinceramente, prefiro Finnegans Wake. É mais denso". Ninguém vai desafiá-lo mais, já que nem os intelequituais mais phodões entenderam direito este último livro. Se eles insistirem, diga que o final de Ulisses com o orgasmo apoteótico de Molly Bloom foi muito interessante. Dê uma risadinha sarcástica. Peça licença, saia da rodinha e vá para outra que estão falando sobre A Divina Comédia de Dante.


Bem, amigos milionários, por hoje é só. Na próxima semana escolho um outro livrão de respeito e tasco a orelha do livro para que você não se sinta desamparado.

 

 

Etiquetas:
publicado por Ana Vidal às 21:51
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22 comentários:
De Grande Jóia a 4 de Fevereiro de 2009
Muito bom, mesmo!
Achei delicioso dizer o que muitos de nós fazemos para impressionar, mas com esse trejeito que só os brasileiros conseguem:)
Parabéns à Marie e à Ana pela contratação.
De Ana Vidal a 4 de Fevereiro de 2009
Obrigada pela minha parte, GJ. Ainda bem que gostou. :-)
De marie tourvel a 4 de Fevereiro de 2009
Perdoe-me pelo atraso em minhas respostas. Hoje foi um diz de muito trabalho.

Patti, querida, acho que as únicas vezes em que não sou prolixa é quando escrevo meus Pocket Classics. E mesmo assim dou uma enrolada. :)

Grande Jóia, és uma jóia mesmo. Obrigada pelos elogios e espero de verdade que eu tenha feito você sorrir. :)

Luísa, querida, um dia conto a história de como tive essa idéia. E sobre Ulisses, é um livro que me deu trabalho para entender. E mesmo entendendo e gostando, ainda acho o Joyce malucão. :))))

Mais uma vez agradeço a todos vocês que vieram por aqui bater um papinho comigo e com a Ana. Agora vou visitar os blogues destes queridos comentaristas.

Semana que vem tem mais. :)

Beijos, Ana, querida.

De Ana Vidal a 4 de Fevereiro de 2009
És um sucesso, Marie, como eu já sabia. Que bom!
Beijos, miúda.
De JuliaML a 4 de Fevereiro de 2009
Ana, não comentei antes, porque tenho que me poupar. estou com uma inflamação muscular que me prende o braço direito. (hoje bem melhor, felizmente)
Quero dizer que fiquei bem feliz pela expectativa de ler a Nossa Marie também aqui.

beijinho e b.q. às duas
De Ana Vidal a 4 de Fevereiro de 2009
Sabia que ias gostar, Júlia.
As melhoras.
Bjs
De Luísa a 4 de Fevereiro de 2009
Marie, acho que vou gostar muito desta sua rubrica. Não só pela sua qualidade e imensa graça, mas também pela sua inequívoca utilidade no que a mim, particularmente, diz respeito. Não sou milionária, mas passo por intelectual. Ora o Ulisses sempre me pareceu osso demasiado duro para o meu dente e, por isso, sempre me senti um pouco amesquinhada e diminuída nalguns meios que o têm como obra de referência. Se ao espirituoso amanuense de Voltaire não sobrava tempo para ter bom gosto, a mim não me sobra tempo (e, às vezes, também paciência) para ter um conhecimento profundo de todos clássicos e poder estar ao nível. Fico assim aguardando com curiosidade – e até ansiedade – os seus «pocket classics». Este já me deu um grande amparo! ;-D
De marie tourvel a 4 de Fevereiro de 2009
Esqueci de dizer à Júlia que espero que ela se restaelça rápido, pois ficar sem os posts do "Privilégio" é como comer goiabada sem queijo. Simplesmente não rola. :))))

Beijos, querida
De Léo e só a 6 de Fevereiro de 2009
oi dona Moça Maire.

Hoje, quinta, 00:40 da madruga, to'qui pra desejar um grande boa sorte nessa nova casa, desse lado de lá do oceano .

abs e beijo ;D
De marie tourvel a 6 de Fevereiro de 2009
Leo, meu querido amigo, você não podia faltar por aqui, né? Um grande beijo e vê se desculpa minha mancada com seu aniversário. :)

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