E amanhã?
Estas últimas semanas têm sido reveladoras, uma vez mais, das nossas fragilidades estruturais enquanto País, e das mediocridades já habituais dos nossos governantes, no modo como enfrentam e resolvem as crises que nos afectam.
Para azar deles, nem a participação lusa no euro lhes deu muita oportunidade para o desvio das atenções, que a expectativa de uma permanência mais duradoura na competição deixava adivinhar. Foi como um fogo-fátuo de rico brilho e glamour ao princípio, para, sem ninguém esperar, se esfumar de repente numa desilusão sombria, no final. Até este Ministério do Ego Nacional acabava por não ajudar à(s) crise(s).
E o País voltou a acordar para a realidade de todos os dias, depois desta bebedeira de patriotismo, entre os aumentos sucessivos dos combustíveis, de bens alimentares, de transportes, das energias, de praticamente tudo do que depende a vida de cada um.
Assistimos, impávidos, ao bloqueio dos camionistas, com as consequentes dificuldades que nos trouxe a todos, sem ouvirmos, se não ao fim de quatro dias, uma atitude de alguém responsável que lhe pusesse cobro. Como é que umas dezenas de rufiões paralisam um País? Que País fica tão profundamente vulnerável com as acções pouco concertadas de parte de um sector profissional, que usou e abusou da liberdade individual de quem se lhe não quis associar, com comportamentos de organização criminosa que, por má sorte, até produziu uma vítima mortal?
A cedência a algumas reivindicações, como estratégia para resolver o problema e apagar o fogo, não é, seguramente, a melhor. Depois dos camionistas já se desenham movimentos entre os agricultores e os taxistas, que, também armados dos seus meios de produção, pensam na melhor forma de atingir os seus objectivos, manietando o Governo e o País com novas ameaças de bloqueios. O fogo só aparentemente está apagado. Fervilha em brasa por baixo das cinzas.
E assim vamos nós, sem cantar e sem rir, de bloqueio em bloqueio, de manifestação em manifestação, em crescente insatisfação social e sem respostas convincentes, cedendo aqui e ali que para o ano há aquilo que todos sabemos, pois quem não chora não mama!
Contraditoriamente, os valores dos endividamentos crescem sem parar, crescendo também os que não são pagos e que engrossam as estatísticas pouco abonatórias do crédito mal parado. Mas porque é que as instituições financeiras insistem em continuar a aliciar as pessoas com a ilusão do crédito fácil? E porque é que o Estado não se impõe, criando regras de mercado que evitem este descalabro?
Difícil é, cada vez mais, a sorte dos sem sorte. Até as instituições de solidariedade estão a braços com uma crise que não esperavam, naturalmente consequência de todas as outras, assistindo ao aumento dos ‘seus clientes’ sem terem meios para acudir a todos, e à diminuição dos contributos dos que as ajudavam, enredados também nas suas próprias dificuldades.
Que não estamos a caminhar para melhor, é uma realidade. Que os preços altos de matérias e de produtos vieram para ficar, é uma certeza. Que ninguém sabe (quem devia saber) dar a volta a estas duas verdades, é um facto consumado. Para mal dos nossos pecados!
Pedro Silveira Botelho